(continuação - Parte II )
...fugirei e procurarei outros como eu… para reconstruir tudo aquilo que a revolta provocou.
Lá fora a multidão ansiava o combate e o seu mortífero respirar conseguia eu mesma aqui escutar. Entretanto fez-se silêncio, uma voz estranhamente familiar lançava frases de ordem exaltando a revolta e os feitos até aqui alcançados. Não era muito perceptível o seu discurso, mas era notório pelo silêncio seguido de cada rejubilar que toda aquela plateia admirava tal pessoa.
Alheei-me totalmente do que me rodeava, esqueci que sabia escutar e imitei-me a sentir por dentro toda a minha raiva e força… seria isso que iria alimentar as minhas vitórias na arena. Neste momento, iria finalmente dar uso às minhas capacidade físicas e estratégicas… a luta, a guerra, sempre foram o meu forte… mas a minha condição de mulher nunca permitiu que pudesse dirigir o meu próprio exército.
Estava preparada… voltei-me novamente para o exterior e só desejava que chamassem quanto antes. Batem à porta… toda a minha confiança inabalável ruiu enquanto escutava aquelas mãos batendo à porta… o som que da porta vinha foi de tal modo intenso que mais parecia que tinham batido directamente no meu coração… enregelei… durante segundos meu sangue congelou… deixei de respirar e de me sentir…e sem que uma palavra saísse sequer da minha boca, logo a porta se abriu…
Surpresa das surpresas, como que chegado ao fim de um túnel escuro que apenas um candeeiro lateral ajudava apenas a ver os contornos de um rosto… um rosto que ganhou voz… que se aproximou e mais visível se tornou, um rosto com uma sonoridade familiar… uma voz com uma imagem presente… um rosto…O rosto de Apolónio!
Apolónio era uma alta patente do exército de Limpia e em tempos foi um grande rival meu aquando dos estudos na Academia das Artes Militares. Sempre tive um enorme respeito e admiração pelas suas capacidades de liderança… era um homem sem passado, vindo de uma família reconhecida no nosso reino, mas que vivia inteiramente para a causa militar. Recordo que em tempos, teve uma discussão com um dos Generais e não mais evoluiu na carreira militar.
Chega-se a mim e friamente, sem pestanejar sequer, me diz:
- “Menina Lana, espero que esteja preparada para enfrentar o medo de frente…”
Eu no silêncio fiquei, acho que minha voz era agora moldada por palavras escritas por mudas mãos… pálidas de vida… mas ele acrescentou algo mais:
- “Tome! Eu próprio escolhi.”
Era uma faca enorme… com uma lâmina super afiada… brilhante… parecia transbordar calor, mas que não seria humano, duvidava até que alguma vez aquela faca tivesse ferido alguém.
Eu, sem uma única palavra dizer, ainda estava sobre o efeito da surpresa enorme de rever Apolónio. Ele continuava frio comigo, como se não me conhecesse… glaciar… que contagiava tudo o que tocava… aquela faca era a prova evidente disso mesmo.
Voltado para mim, olhou bem fundo nos olhos e perguntou:
- “Preparada?!”
- “SIM!”, respondi eu de pronto.
Finalmente saíra de mim um som. Não sei de que forma falei mas consegui provocar em Apólito uma reacção física… vi nos seus olhos negros um clarão do tamanho da força do meu “SIM”. Dirigi-me então pelo escuro túnel, enquanto isso, seguia as largas e fortes costas de Apólito, bebendo naquele tronco um pouco mais de força... e mais força ainda ia buscar ao som da multidão.
Eis o circulo (que seria meu)… olhei para a multidão apinhada, movimentada… todos gritavam e olhavam-me com uns olhos repletos de uma voraz sede de sangue… não mais olharia para aqueles seres sujos, imundos… seguia agora de cabeça baixa, olhando unicamente para aquela faca que tornava o meu braço um verdadeiro punhal, pronto e desejoso de fazer estragos.
Entrei no circulo e aguardei a chegada das adversárias…
(continua na Parte III)
Nota: Este texto é exclusivamente do Filipe em resposta ao desafio.