Entrou no café como o faz todos os dias. Com a mesma desenvoltura e aparente segurança de todos os dias. Conhece todas as empregadas pelo nome e trata-as com uma delicadeza e educação de tempos idos. Nenhuma lhe conhece o nome mas também não lhes importa. Só lhe reconhecem o rosto devido à repetição diária de o verem chegar. Provavelmente não lhe dariam pela falta quando deixasse de lá ir. Tal qual como também não dão pela sua presença. Pede o mesmo de sempre, para não quebrar rotinas, e senta-se a ler o jornal. Páginas cheias de sangue, pessoas cheias de pecados, notícias cheias de mentiras. Na verdade não lê... passa com os olhos... talvez seja do hábito de os ter apontados para baixo.
Volta a repetir o pedido, quase como quem pede desculpa por estar a incomodar, quase como quem pede sem ter que usar a voz. Começa a fazer as palavras-cruzadas. Quem por lá pára se o tivesse que descrever fazia-o provavelmente para dizer apenas “É o Homem das Palavras-cruzadas”. A bem da verdade não as faz. Nunca conseguiu terminar. E a meio cansa-se daquela escrita que é feita ora na vertical, ora na horizontal para inventar palavras pelo meio. Nas intersecções temos sempre que inventar qualquer coisa, ele fazia-o em pequenas quadrados onde apenas uma letra cabe.
As conversas acontecem sem o ter em conta e às perguntas que surgem dele nunca ninguém ficava à espera das respostas. Assim como ele nunca esperava que a pergunta lhe fosse dirigida. As palavras, da mesma espécie que ele tentava cingir em pequenos quadrados num papel sujo de jornal, flutuavam ao seu lado. A sua invisibilidade tapa-o dos olhares dos outros... acredito que houvesse vezes em que só viam uma caneta a escrever em cima dum jornal... será que reparariam em quem escrevia?
Amanhã vai entrar de novo no café como todos os dias faz. E as palavras lá estarão à espera dele para que as cruze.
O que eles disseram faz agora dez anos
Há 11 horas
Ele não quer cruzar palavras....segue uma rotina...como se trata o ar que respira....olha para os quadrados como quem olha para o infinito..mas o seu pensamento é só um.......o amor invade-lhe o cérebro..é feliz assim...ou não mas pelo menos sacia o ego.
ResponderEliminarespero ter entendido o post?????
Percebeste mais do que pensas... ou então mais do que eu estava à espera que percebessem!!
ResponderEliminarSó demonstra que não és nada 'breja' tonto!! :)
muito fixe!
ResponderEliminarObrigada Elora :)
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